Encontro-me numa fase em minha vida que é difícil pensar em algo que esteja dando verdadeiramente errado: tenho saúde (na medida do possível, tendo em vista a vida que levo); tenho dinheiro o suficiente para levar uma vida agradável (no sentido de que a falta de dinheiro ainda não barrou minhas ambições) ; todos os trabalhos acadêmicos aos quais me dedico, me trazem o retorno que procuro (até quando não me empenho tanto quanto deveria, devo ser bem sincera); recentemente, realizei o sonho de uma vida inteira (e quantas pessoas, me diz, tem esse privilégio na vida? Acredito, humildemente, que poucas...); além de ter uma família que me apóia, pode ser considerada saudável e não tem nenhum problema absurdamente anormal...
Porque, então, eu não consigo ser verdadeiramente feliz? - me pergunto.
Porque eu sou uma ingrata. Sortuda pra caramba e, mesmo assim, ingrata. - É a única conclusão a qual chego.
Várias vezes me peguei pensando em porque não consigo, do fundo do meu coração, ser plenamente feliz. Ok, acredito que ninguém o é, já que a angústia e a falta fazem parte do que é ser humano. Mas sinto que com frequência, quem me trai, quem me faz infeliz, é minha própria mente. A força do pensamento é algo inegável, ao meu ver. Tudo está tranquilo, tudo está bem, até minha própria mente trazer a tona aquele momento, aquela lembrança, aquela sensação de que é possível ser mais feliz do que se é no presente. A pior parte de tudo é saber que, por experiência própria, realmente, é possível ser mais feliz do que se é. Eu já fui. E isso me leva a pensar no peso que temos que carregar (até o fim da vida?) por termos realizado um sonho.
Porque, então, eu não consigo ser verdadeiramente feliz? - me pergunto.
Porque eu sou uma ingrata. Sortuda pra caramba e, mesmo assim, ingrata. - É a única conclusão a qual chego.
Várias vezes me peguei pensando em porque não consigo, do fundo do meu coração, ser plenamente feliz. Ok, acredito que ninguém o é, já que a angústia e a falta fazem parte do que é ser humano. Mas sinto que com frequência, quem me trai, quem me faz infeliz, é minha própria mente. A força do pensamento é algo inegável, ao meu ver. Tudo está tranquilo, tudo está bem, até minha própria mente trazer a tona aquele momento, aquela lembrança, aquela sensação de que é possível ser mais feliz do que se é no presente. A pior parte de tudo é saber que, por experiência própria, realmente, é possível ser mais feliz do que se é. Eu já fui. E isso me leva a pensar no peso que temos que carregar (até o fim da vida?) por termos realizado um sonho.
Realizar um sonho é diferente de realizar um desejo, que fique claro. Eu desejo conseguir que meu artigo seja aprovado naquele congresso, desejo conseguir viajar no fim de ano, desejo rever meus amigos, desejo que aquele evento dê certo. Esses são desejos, que são bem poderosos, mas não chegam a ser sonhos.
Sonho é algo maior. O sonho direciona sua vida, faz que você arquitete estratégias, se planeje, haja, se dedique integralmente para atingi-lo. Ele exige isso como preço pela recompensa que promete entregar.
Eu passei por tudo isso. Acredito que nos últimos 15 anos da minha vida, me empenhei ferrenhamente para conquistar o meu sonho. 15 anos é muito tempo. 15 anos focando em apenas um objetivo, é muito tempo. Por 15 anos, eu agi porque queria isso. E, olha só, consegui realizar.
Eu passei por tudo isso. Acredito que nos últimos 15 anos da minha vida, me empenhei ferrenhamente para conquistar o meu sonho. 15 anos é muito tempo. 15 anos focando em apenas um objetivo, é muito tempo. Por 15 anos, eu agi porque queria isso. E, olha só, consegui realizar.
E, pra melhorar, a realização, a própria vida em si, conseguiu superar minhas expectativas e ser melhor que meu SONHO. Não sei se todos conseguem entender o que é isso: quando a sua própria vida é melhor do que a sua imaginação pôde imaginar. Quando você tem dó de dormir, porque sabe que estará perdendo o tempo que poderia estar vivendo. Quando, todo dia, você abre os olhos e tem que buscar racionalmente a prova de que tudo aquilo é real, olhando pro teto deitada em sua cama. E eu não tô falando isso como uma expressão; eu realmente fazia isso todos os dias. Sem exageros. Vivi meu sonho por exatos 6 meses, o que, originalmente eu achei que fosse ser o suficiente pra saciar o que eu esperei por tanto tempo mas agora vejo que foi tão rápido que chega a ser um afronte frente aos 15 anos de dedicação.
Viu? Já estou sendo ingrata de novo.
Mas é que é difícil de explicar. É difícil de explicar caso você não tenha passado por isso. É difícil entender a dor, a saudade, a frustração, o vazio que fica aqui dentro que chega a sufocar.
É difícil voltar a vida "normal" depois disso, entende?
Acho que não...
Basicamente, é difícil voltar porque o nível de comparação entre as coisas fica muito, muito alto. E é aí que vem o que eu já disse: os momentos, as memórias e a sensação de que tudo poderia ser melhor vem a tona - não no sentido esperançoso, mas no sentido empírico da coisa.
O problema é que eu nunca tinha parado pra pensar o que acontece depois que você realiza um sonho.
O problema é que eu nunca tinha parado pra pensar o que acontece depois que você realiza um sonho.
Eu não tô acostumada a viver sem ter um sonho. Por 15 anos, eu acordei e agi visando uma coisa. E agora, essa coisa, passou. Porque é tão difícil apenas ser grata por ter vivido o que vivi, e continuar em frente? Isso me corta o coração: eu só consigo sentir falta, mas não consigo ser essencialmente, puramente, verdadeiramente grata. Porque é tão difícil dispôr de gratidão?
Quero que entendam que não reclamo por ter conquistado meu sonho. Pelo contrário, já agradeci milhões de vezes a todos que me ajudaram, e a tudo que aconteceu pra que eu conseguisse chegar lá. O que acontece é que eu não consigo mais valorizar o que eu tenho HOJE. E essa é minha maior angústia...
Não sou uma pessoa religiosa, mas tenho meu olhar sobre a fé. Quando sinto que algo não tá bem, que preciso de um acolhimento que vá além do físico, eu busco uma ajuda espiritual, e sempre me surpreendo.
Hoje decidi abrir aleatoriamente meu "Evangelho segundo o Espiritismo" e, olha só, abri bem na página da ingratidão, mais especificamente na seguinte passagem: "De todas as provas, as mais penosas são as que afetam o coração; alguém suporta com coragem a miséria e as privações materiais, mas sucumbe ao peso dos desgostos domésticos, esmagado pela ingratidão dos seus. Oh! é uma pungente angústia essa! Mas que pode melhor, nessas circunstâncias, revelar a coragem moral que o conhecimento das causas do mal e a certeza de que, se há extrema aflição não há desesperos eternos, porque Deus não pode querer que sua criatura sofra sempre. Que mais consolador, mais encorajador que esse pensamento de que depende só de si as causas do mal? Mas, para isso, é preciso não deter o olhar sobre a Terra e não ver senão uma única existência; é preciso se elevar, planar no infinito do passado e do futuro; então, a grande justiça de Deus se revela ao vosso olhar, e esperais com paciência, porque entendeis o que vos parecia monstruosidades na Terra; as feridas que nela recebeis não vos parecem mais que arranhões."
Não sou uma pessoa religiosa, mas tenho meu olhar sobre a fé. Quando sinto que algo não tá bem, que preciso de um acolhimento que vá além do físico, eu busco uma ajuda espiritual, e sempre me surpreendo.
Hoje decidi abrir aleatoriamente meu "Evangelho segundo o Espiritismo" e, olha só, abri bem na página da ingratidão, mais especificamente na seguinte passagem: "De todas as provas, as mais penosas são as que afetam o coração; alguém suporta com coragem a miséria e as privações materiais, mas sucumbe ao peso dos desgostos domésticos, esmagado pela ingratidão dos seus. Oh! é uma pungente angústia essa! Mas que pode melhor, nessas circunstâncias, revelar a coragem moral que o conhecimento das causas do mal e a certeza de que, se há extrema aflição não há desesperos eternos, porque Deus não pode querer que sua criatura sofra sempre. Que mais consolador, mais encorajador que esse pensamento de que depende só de si as causas do mal? Mas, para isso, é preciso não deter o olhar sobre a Terra e não ver senão uma única existência; é preciso se elevar, planar no infinito do passado e do futuro; então, a grande justiça de Deus se revela ao vosso olhar, e esperais com paciência, porque entendeis o que vos parecia monstruosidades na Terra; as feridas que nela recebeis não vos parecem mais que arranhões."
E no fim das contas, é isso que eu acredito, é isso que eu tento trazer pro racional sempre: Tudo isso é passageiro, todas as dores aqui tem um motivo e passam, tudo faz parte de um plano maior, tudo se encaixa, tudo se justifica. Só que as provas mais penosas são as que afetam o coração.
Ler isso me ajudou a me acalmar, como se tivesse achado justificativa pro que sinto. Sou humana, sou mortal, e o fato de ter sentimentos, me enfraquece. Mesmo assim, aceito o preço de sentir em detrimento a me poupar disso: é quando se sente intensamente, que se constroem as melhores passagens da vida. No momento, posso não estar forte o suficiente pra conseguir reverter minha ingratidão, mas espero e acredito que um dia, vou conseguir.
Quando duvido da existência do infinito, da pureza do espírito, do ínfimo valor das coisas materiais, lembro-me de um exercício que vi certa vez em algum lugar, não sei onde. Acho que o objetivo desse exercício era provar que podíamos levitar, sentir o peso do espírito, ou algo do tipo. Só sei que é isso que eu sinto e, comigo, ele funciona. É bem simples: Quando se quer levitar, basta prestar atenção no instante (se é que pode-se chamar de instante algo tão rápido) em que a inspiração vira expiração, e vice versa. Sim, só isso. E sim, funciona - comigo. Fazendo isso, eu consigo sentir no meu próprio corpo como as coisas são passageiras. Consigo sentir a existência de algo aqui dentro que faz toda a carne se mover. Consigo acreditar que eu sou um nada em meio a tudo, mas que sou tudo pra mim. E, como a própria passagem disse, que sou eu a responsável pelas causas do mal que deixo que me aflijam. E concluo: que responsabilidade, hein?
Falando assim, até parece que tenho auto-controle sobre essas coisas. Não tenho, mas estou me esforçando na busca. E, para isso, além dessas coisas que já descrevi, me utilizo de mais um artifício: leio sempre uma pequena precezinha que me foi apresentada por alguém muito especial e que eu me apaixonei instantaneamente - a prece da serenidade.
"Senhor, dê-me serenidade para aceitar as coisas que não posso modificar, coragem para modificar as que posso, e sabedoria para reconhecer a diferença entre elas."
Falando assim, até parece que tenho auto-controle sobre essas coisas. Não tenho, mas estou me esforçando na busca. E, para isso, além dessas coisas que já descrevi, me utilizo de mais um artifício: leio sempre uma pequena precezinha que me foi apresentada por alguém muito especial e que eu me apaixonei instantaneamente - a prece da serenidade.
"Senhor, dê-me serenidade para aceitar as coisas que não posso modificar, coragem para modificar as que posso, e sabedoria para reconhecer a diferença entre elas."
No fim das contas, esse é o objetivo de tudo que eu disse. É isso que eu quero atingir. Sei que esse desejo beira o impossível quando se é humano, mas, só por enquanto, vou colocá-lo no lugar do meu objetivo principal, meu sonho. Quem sabe, né?
Enquanto isso, vou espalhando "obrigada's" por aí, me sentindo ingrata mesmo tendo uma vida tão cheia de conquistas, e buscando melhorar sempre (sem o peso hipócrita de quem diz isso da boca pra fora, mas pensando nisso como única maneira de se atingir um egocêntrico bem-estar).
Enfim, obrigada.